RELAÇÃO DE CAUSALIDADE - DIREITO PENAL
- vitoria fachin
- 20 de out.
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Teoria da equivalência dos antecedentes (eliminação hipotética dos antecedentes causais): todo e qualquer fator que tenha contribuído para o resultado deve ser considerado sua causa, assim, a não ocorrência de qualquer dos fatores leva a não produção do resultado. Utiliza-se da fórmula “conditio sine qua non” = um antecedente será causa, quando sem a sua ocorrência o resultado não seria produzido. Essa teoria não estabelece diferença entre causa, condição e concausa.
Obs. A teoria da equivalência dos antecedentes foi adotada no caput do art. 13, CP.
Obs. Alguns autores consideram a teoria da eliminação hipotética dos antecedentes causais como sinônimo da teoria da equivalência dos antecedentes.
Críticas: A teoria da equivalência dos antecedentes poderia gerar o regresso ad infinitum.
Teoria da adequação e da relevância: não basta que a causa seja um antecedente que sem sua ocorrência o resultado não ocorra, mas também, que a causa seja idônea (apta a gerar o resultado), ou seja, só seria causa uma conduta que possua uma tendência geral de produzir o resultado típico. Essa teoria exige contribuição causal e idoneidade individual mínima. Ademais, há diferença entre causa (antecedente adequado) e condição (antecedente sem mínima idoneidade).
Crítica: A teoria da adequação eliminaria o nexo causal na hipótese da mínima probabilidade de determinada conduta produzir o resultado. Ademais, seria confusa por não estabelecer critérios específicos para diferenciar causa e condição.
Diante das críticas Mezger a transformou em teoria da relevância = só seria causa a condição relevante para o direito. Essa teoria difere conceito causal e conceito de relevância, ou seja, o problema da causalidade deve ser resolvido por um conceito científico-geral, já o problema da relevância deve ser resolvido por um critério jurídico-penal (tipos penais). Assim, a novidade dessa teoria é considerar a tipicidade para responsabilizar o agente.
Teoria da causalidade adequada de Von Kries/teoria causa eficiente ou qualidade do efeito/teoria da condição qualificada ou individualizadora: é aquela segundo a qual é causa a pessoa, fato ou circunstância que, além de praticar um antecedente indispensável à produção do resultado, realiza uma atividade adequada à sua concretização.
Na determinação da causalidade adequada, o que importa é se há um nexo normal prendendo o atuar do agente como causa ao resultado como efeito. O problema se resume, então, em assentar se, conforme demonstra a experiência da vida, o fato conduz normalmente a um resultado dessa índole; se esse resultado é consequência normal, provável, previsível daquela manifestação de vontade do agente. O fundamento desse juízo é um dado estatístico, é um critério de probabilidade. Ou seja, deve se analisar quais condutas anteriores foram condições mais ativa e eficaz para produção do resultado. (Manual Revisaço Direito Penal)
Teoria da condição INUS: normalmente um resultado é provocado por diversas causas, de modo que cada efeito pode ser provocado por um grupo diferente de fatores. Assim, cada grupo é suficiente para provocar o resultado, mas nenhum é necessário - cada fator é uma condição INUS. Condição suficiente é aquela que produzirá o resultado, já condição necessária é aquela imprescindível, mas insuficiente, dependendo de outros fatores. Por exemplo, o curto-circuito é condição INUS para um incêndio em uma casa, mas é insuficiente, dependendo de outros fatores.
Teoria da imputação objetiva: busca um conteúdo normativo para a imputação do resultado, abandonando a imputação do resultado com fundamento naturalístico. Para a imputação objetiva busca-se verificar se a conduta produziu um risco não permitido (risco proibido ao bem jurídico tutelado), risco esse que deve ter sido o produto do resultado.
Por se tratar de uma doutrina sem base na lei, mas doutrinária, não há uma resposta única. A doutrina majoritária entende que, no caso do exemplo da vítima agredida, mas que morre na ambulância por um acidente de carro, ou no hospital, em razão de um incêndio, a imputação objetiva impede a responsabilização do agressor, que fez com que a vítima estivesse na ambulância ou no hospital. Assim, o agressor responderia por tentativa de homicídio, isso porque não responderia objetivamente pelo resultado morte.
No Brasil, esses exemplos seriam resolvidos com a exclusão do nexo causal, aplicação do art. 13, §1º, CP: A superveniência de causa relativamente independente exclui a imputação quando, por si só, produziu o resultado; os fatos anteriores, entretanto, imputam-se a quem os praticou.
Obs. Desvalor da conduta: enquanto o causalismo e o neokantismo consideram apenas o desvalor do resultado, o finalismo passou a considerar, também, o desvalor da conduta/ação (finalidade). Assim, a causalidade seria o tipo objetivo, enquanto o desvalor da ação seria o tipo subjetivo.
Desvalor do resultado = ocorrência do resultado + produção do resultado decorrente de risco proibido.
Desvalor da ação = imputação objetiva (risco proibido) + imputação subjetiva (dolo ou culpa).
A doutrina majoritária entende que a causalidade material é pressuposto da imputação objetiva, ou seja, apenas depois de constatado o nexo de causalidade, deve-se verificar a imputação objetiva (nexo de causalidade = análise mecânica e imputação objetiva = análise normativa).
Assim, a teoria da imputação objetiva exige que a conduta crie um risco proibido para a produção do resultado. Para Greco, a análise do risco proibido, deve considerar que há um interesse geral de limitar o poder de punir do Estado e reconhecer a liberdade dos cidadãos. Desse modo, somente quando necessário para proteger bens jurídicos mais relevantes, deve-se reconhecer que a liberdade do agente não abarca aquele risco proibido, que se manifestou no resultado típico.
Concepção de Roxin sobre a teoria da imputação objetiva: divide-se a imputação objetiva em três passos:
1º) risco proibido não coberto por um risco permitido: um resultado causado pelo agente só pode ser imputado ao tipo objetivo, se sua conduta houver criado um risco proibido não abarcado por um risco permitido. Por exemplo, tio que manda seu sobrinho para o alto da montanha, para que ele seja atingido por um raio e morra, não há risco proibido.
2º) perigo deve ser realizado no resultado concreto: seria a aplicação da concausa relativamente independente superveniente que por si só produziu o resultado, que excluiu o nexo. Por exemplo, agente pratica a lesão leve, vítima vai ao hospital e morre por incêndio. Nesse caso, houve risco proibido (lesão leve), mas o perigo (gerado pelo agente) não se realizou no resultado morte. Isso porque, o perigo apenas seria realizado no resultado se a morte viesse a ocorrer pela lesão.
3º) âmbito de abrangência da norma (resultado está fora do alcance do tipo): excepcionalmente, pode desaparecer a imputação se a abrangência da norma incriminadora não alcança determinados perigos e suas repercussões. Por exemplo, A convida B para uma escalada perigosa desejando a morte de B, que efetivamente ocorre. Nesse caso, o âmbito de abrangência da norma (fundamentou no direito alemão) não alcança a autocolocação em perigo.
Obs. Roxin entende que desvalor da conduta e desvalor do resultado são indissociáveis.
Obs. Para a imputação objetiva de Roxin, não há imputação do resultado se o agente diminui o risco ao bem jurídico. Ademais, não há imputação no resultado, se a conduta não represente um risco juridicamente relevante.
Teoria da elevação do risco ou incremento do risco (critério utilizado por Roxin na concepção da sua teoria da imputação objetiva): ainda que a exposição ao risco seja permitida, o incremento do risco torna possível a imputação objetiva. Assim, o agente só não será responsabilizado pelo resultado se sua conduta não elevar o risco, ou seja, se o agente aumenta o risco além do permitido, ainda que o fato tivesse ocorrido se o agente houvesse atuado de forma prudente, responderá pelo resultado.
Obs. Roxin, também, excluiu a imputação objetiva nas seguintes hipóteses:
· teoria do fim de proteção da norma (exclui a imputação objetiva se o resultado produzido não estava abarcado pelo âmbito de proteção da norma);
· autocolocação dolosa em risco;
· colocação em perigo da pessoa com seu consentimento;
· resultado cujo impedimento esteja na esfera de responsabilidade alheia.
Concepção de Jakobs sobre imputação objetiva: para ele a imputação objetiva deve ter uma coerência sistemática. Isso porque a ideia de sistema (a partir da concepção de Niklas Luhmann) é a base do funcionalismo sistêmico - teoria defendida pelo autor. Ressalta-se que para o funcionalismo radical de Jakobs a função da norma penal é garantir sua validade, sendo a pena a reafirmação da validade da norma. Para ele a imputação objetiva deve considerar o método dedutivo, ou seja, partir da teoria para os casos concretos, e possui dois níveis: nível do comportamento e nível do resultado.
Nível do comportamento: considera a imputação do comportamento como típico. Nesse caso, a imputação do resultado será excluída: risco permitido, princípio da confiança, competência da vítima ou proibição de regresso.
Nível do resultado: se refere à imputação do resultado naturalístico ao autor. Para Jakobs, a causalidade é condição mínima para a imputação objetiva, por isso, o nexo causal é tratado dentro da imputação objetiva.
Assim, defende que a imputação objetiva leva em consideração: criação do risco não permitido + realização do risco não permitido no resultado.
Obs. Para ele os casos de autocolocação em perigo ou de heterocolocação em perigo devem ser resolvidos pela competência da organização, ou seja, essa competência incumbe a quem deve assegurar a sua própria organização, para que não se produzam riscos além dos permitido. Por exemplo, o empresário é garantidor dos riscos produzidos por sua atividade. Assim, aquele que se coloca em uma situação de perigo, dela não se afasta e é competente pelas consequências.
Imputação objetiva nos crimes omissivos impróprios: na omissão imprópria o agente é responsabilizado porque devia e podia evitar o resultado (posição de garante) e responderá por meio de uma cláusula genérica de extensão - art. 13, §2º, CP: A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem: a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância; b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado; c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do resultado.
A teoria da imputação objetiva nos crimes omissivos impróprios está atrelada às seguintes teorias:
· teoria da evitabilidade: o agente será responsabilizado se, caso ele tivesse atuado, o resultado teria sido evitado com uma probabilidade próxima da certeza.
· teoria da diminuição do risco: o agente que deveria ter agido e, mesmo podendo agir, se omitiu, deve ser responsabilizado se sua atuação teria criado chance de salvamento - aumentado a chance de o resultado não ocorrer.
Obs. Crime omissivo próprio é aquele que a omissão está prevista em lei (a norma tipifica determinada omissão) - o exemplo clássico é o crime de omissão de socorro - art. 135, CP: Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública.
Observações gerais:
- Para o defensor da teoria da imputação objetiva, Gimbernart Ordeig, ela se traduz em um filtro apenas normativo de condutas dolosas ou culposas, para que sejam consideradas ou não típicas.
- o caput do art. 13, CP adotou a teoria da equivalência de condições: O resultado, de que depende a existência do crime, somente é imputável a quem lhe deu causa. Considera-se causa a ação ou omissão sem a qual o resultado não teria ocorrido.
- vários autores defendem a teoria da imputação objetiva como limitação do resultado, após a análise da causalidade pela equivalência das condições, que gera um regresso infinito.
Concausas: são antecedentes causais de um mesmo resultado, cuja não ocorrência eliminaria o resultado. Esses antecedentes ou condições, a depender da ordem cronológica de sua ocorrência, podem ser preexistentes, concomitantes ou supervenientes. Ainda, podem ser absolutamente independentes ou relativamente independentes.
· Concausa absolutamente independente: a causa do resultado não se origina na conduta do agente, direta ou indiretamente - o nexo causal sempre é rompido (independente de ser preexistente, concomitante ou superveniente) - o agente responde pela tentativa. Por exemplo, o agente coloca veneno no café de B, todavia, antes do envenenamento, C ingressa no local e dispara três tiros mortais em B, que vem a falecer pelos tiros. Nesse caso, o agente responderá pelos atos já praticados, ou seja, tentativa de homicídio.
· Concausa relativamente independente: a causa do resultado não se origina na linha desdobramento causal da conduta, todavia, origina-se, ainda que indiretamente, da conduta do agente, ou seja, as concausas se conjugam e produzem juntas o resultado (isoladamente não seriam capazes de gerar o resultado, conforme Rogério Sanches) - em regra não rompe o nexo causal. Por exemplo, o agente provoca lesão corporal grave na vítima, que vem a falecer por infecção hospitalar. Nesse caso, a vítima só estava no hospital, em razão da lesão corporal sofrida, por isso, o agente responderá pelo homicídio consumado.
Obs. Concausa relativamente independente superveniente que por si só produziu o resultado: Existe uma possibilidade de afastar a responsabilidade com o rompimento do nexo causal, hipótese inserida no CP, §1º, art. 13, quando verificado que a concausa relativamente independente é SUPERVENIENTE + POR SI SÓ PRODUZIU O RESULTADO. Assim, será necessário demonstrar, no caso concreto, que aquela causa não estava na linha natural dos acontecimentos (linha de desdobramento da conduta), e, por isso, romperá o nexo causal. Nesse caso, o agente responderá apenas pelos resultados já praticados (pela tentativa).
Exemplos: o agente causa lesão grave na vítima, que vem a falecer por acidente de trânsito entre a ambulância e outro veículo ou o agente lesiona gravemente a vítima, que vem a falecer em decorrência de erro médico, em ambos os casos o nexo será rompido, pois as causas (acidente de trânsito e erro médico) não estavam na linha de desdobramento da conduta (lesão corporal) do agente, respondendo apenas por tentativa de homicídio.
Obs. Para Nelson Hungria, a concausa relativamente independente superveniente que por si só produziu o resultado é uma restrição à teoria da equivalência dos antecedentes adotada no caput do art. 13, CP, que é a regra
Obs. Concausa relativamente independente preexistente: Por exemplo, o agente lesiona a vítima, mas a lesão era leve e não seria capaz de ocasionar o evento morte, todavia, a vítima era hemofílica e, em razão dos ferimentos, vem a falecer. O nexo não será rompido, e o agente responderá pelo homicídio consumado, pois sem sua conduta o resultado não teria ocorrido - aplica-se na análise da causalidade a equivalente dos antecedentes, regra (caput do art. 13, CP), ou seja, a concausa relativamente independente preexistente não exclui a imputação do resultado.
Obs. Concausa relativamente independente concomitante: Por exemplo, ANTÔNIO, com intenção de matar, atira em JOÃO, mas não atinge o alvo. A vítima, entretanto, assustando, tem um colapso cardíaco e morre. ANTÔNIO responderá por homicídio consumado, pois se não tivesse atirado, a vítima não sofreria a violenta perturbação emocional que gerou o colapso cardíaco. Percebam que até este momento, as análises dos vários casos são feitas utilizando-se a causalidade simples (art. 13, caput do CP) e o resultado é imputado ao agente de acordo com o seu dolo […]”. (CUNHA, Rogério Sanches. Manual de direito penal – parte geral, 8ª edição, 2020). Ou seja, a concausa relativamente independente concomitante não exclui a imputação do resultado.
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Fonte: Avelar, Michael Procopio, Manual de Direito Penal - Volume Único - Parte Geral e Parte Especial. 2ed, rev., atual e ampl. São Paulo: Juspodivm, 2023, págs. 299-320.
Resumo feito em agosto/2024 por Vitória Fachin.

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